INSÓNIA (mais uma noite sem dormir)

A solidão de uma noite fria de Inverno leva-nos inevitavelmente a uma profunda reflexão sobre o Sentido da vida. Qual a origem do Cosmos? Que segredos se escondem para lá da barreira de Planck? E por detrás da barreira de betão que separa o vestiário feminino do masculino no ginásio? Porque razão ainda ninguém fez um orifício na parede?
Nestas noites de InSónia, não me resta alternativa senão ver televisão até tarde. A Sónia é uma brasileira que vive no apartamento ao lado e, volta e meia, vão uns gajos a casa e… é In-Sónia a noite toda. Os gajos gritam tanto que ninguém no prédio consegue dormir. Certa vez, alguém chamou a Policia; os agentes bateram à porta, entraram e não mais foram vistos! Quer dizer… foram vistos a sair às oito da manhã.
Levanto-me, bebo um copo de água e dou uma saltada à sala, ligo a televisão e descubro que uma das personagens da telenovela da TVI foi assassinada. Se o homicida conseguir despachar uma vítima por dia, significa que lá para 15 de Fevereiro (contando com os fins-de-semana) todo elenco estará morto, felizmente! O caso assumiu contornos de tal gravidade que a TVI já meteu em acção o melhor agente da Policia Judiciária, o Inspector Max.
De onde viemos, para onde vamos? Vivemos num mundo real ou imaginário? O relinchar do amigo da Sónia parece bem real. Tanto, que por este andar ainda me vou tornar viciado nas corridas de cavalos. No entanto, se a realidade for apenas a materialização do nosso cogito, significa que objectivamente o Cobrador de fraque que me persegue, não existe.
Afinal quem tem razão quanto à origem do universo? A ciência ou a Religião? Apesar da explicação religiosa ser a mais cómoda ao ser humano, que apenas concebe a dinâmica do movimento através da relação causa-efeito, ainda está por explicar como é que alguém é expulso dum local só por comer uma maçã ou o porquê do mais significativo representante do criador na Terra se fazer montar nuns sapatos Prada feitos em pele?
A Sónia, entretanto parou. Aproveito para dormir um pouco e… sonhar… Vou conduzindo ao lusco-fusco por uma estrada de alcatrão tão velha e estreita quanto sombria. Ela surge do nada; uma enfermeira esguia de uniforme branco ridiculamente encolhido devido a uma lavagem a temperatura superior a 60 graus sem usar o Tide. Segura na mão direita uma enorme e ameaçadora seringa. Pergunto-lhe se quer boleia e ela responde que não é real, que eu não sou real e que, na verdade, nada existe a não ser a nossa percepção espaço-temporal (cá está!). Vou para casa e descubro horrorizado ao espelho que tem razão. Tudo o que consigo ver é a materialização da minha alma. Corro ao Banco e tento convencer o gerente que a minha divida não existe e que a melhor coisa a fazer é rasgar aquilo que julgamos ser os meus documentos de hipoteca, mas por alguma razão ele parece duvidar. Volto ao local do rendez-vous com a enfermeira e ela já lá não está. Fico aborrecido porque me esqueci de lhe perguntar o número de telefone e se tinha planos para o fim-de-semana; mas como isto é um sonho, que se lixe! Mais à frente encontro um coelho gigante a saltar à corda. Pergunto-lhe se não é demasiado grande para coelho e ele responde que sim!